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Desmascarando os ciclos de treino de “3 semanas on e 1 semana off”

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Mulher vestida de preto correndo em dia chuvoso em rua beirando rio, com ponte ao fundo. Aproveitando a fase de descanso de em seus ciclos de treino

Abra qualquer programa de treino de, praticamente, qualquer publicação sobre corrida e inevitavelmente você verá uma estrutura com ciclos de treino: 3 semanas “on” seguido de 1 semana “off”. Geralmente na nomenclatura de treinos, isso significa 3 semanas de treinos mais difíceis e/ou com mais volume, seguidos de uma semana de treinos fáceis e/ou com pouco volume, e então o ciclo se repete.

O que você encontrará nesta página:


Você já parou para pensar por qual motivo essa estrutura de 3:1 apareceu em primeiro lugar? As raízes desse tipo de filosofia de treinamento surgiram mais por conveniência (aproximadamente 4 semanas no mês) e tradição, do que por fisiologia. Apesar da falta de lógica, programas de treinos estáticos são abundantes nesse fluxo uniforme e cíclico de semanas difíceis e fáceis.

Ciclos de treino não precisam ser 3 on e 1 off

A estrutura dos treinos não precisa ser desta forma. Os ciclos de treino não precisam seguir estritamente a proporção de 3:1, independente do atleta, época do ano, esporte ou foco de treinamento. Em vez do calendário orientar quando se deve ir forte ou fácil, faz mais sentido que o seu treinamento dite o fluxo de difícil e fácil. Em última escolha, embora difícil de seguir e executar, resultará na maximização de seu esforço e tempo para que você se esforce quando puder, descanse quando não puder fazer força e colha mais recompensas ao longo do caminho.

Comece pelos fundamentos de treinamento

Para começar, precisamos entender que fundamentalmente, o treino faz a nossa performance deteriorar no curto-prazo (dias e semanas) antes dela melhorar no longo-prazo (semanas e meses). Você precisa treinar forte o suficiente para que o seu corpo diga “caramba, isso foi difícil. É bom eu melhorar minha fisiologia se quiser continuar fazendo isso e não morrer”. Sem o estresse de treino suficientemente difícil e então a devida recuperação, você não irá melhorar. Você precisa dos dois, não apenas um ou outro.

Neste sentido, o treino pode parecer como um bom gráfico de ações com a “melhoria” no eixo Y e o “tempo” no eixo X. A tendência geral ao longo do tempo será ascendente, mas não irá subir sempre a cada semana.

Gráfico de melhoria do desempenho do atleta ao longo do tempo, com fadiga acumulada, descanso e a compensação resultando na melhoria
Gráfico de desempenho, acúmulo de fadiga, descanso e melhoria

A lição de casa aqui é que você não verá recordes pessoais toda semana. Se você está, parabéns! Ou você é novo no esporte e/ou o seu treino é tão fácil que irá estagnar em algum momento. Até mesmo quando o atleta possui algum histórico de treino,ele deve esperar que o seu desempenho – em algum momento – venha a piorar antes de aplicar descanso e ver melhorias.

Avaliando os sinais

Aqui será abordado um checklist de 3 pontos a ser abordado com os atletas para determinar quando se deve aplicar um descanso entre os ciclos de treino. É baseado na fisiologia, prática e, se disponível, dispositivos que podem medir pontos como sono e variabilidade da frequência cardíaca (ou FC de repouso).

Sinal #1: Queda no desempenho

O seu primeiro indicador, e o mais importante, para medir quando precisa de descanso é quando o seu desempenho diário começa a cair a partir de um certo momento. Se você está fazendo intervalados regulares e corridas mais fortes, você terá uma média de desempenho que pode usar como base semana-a-semana. Ao comparar o seu pace médio nesses treinos de semanas mais intensas, você pode ver se você está se saindo melhor, pior, ou se mantendo “de lado”. Quando a sua performance cai uns 3-8% ou mais por 2 vezes nas últimas 3 sessões de treinos, é o momento adequado de entrar com um descanso.

Qualquer desempenho que caia até 3% dos seus dias de treino é uma variação aceitável e não deve gerar um alerta. Geralmente esses nem podem ser considerados uma queda no desempenho, é apenas “ruído” na medição, então, continue com os seus treinos. Similarmente, qualquer outro dia que o seu desempenho caia de 3-8% deveria ser antecipado e não se deve pensar muito em continuar com o período de treinos difíceis.

Mas, quando você vê que 2 das 3 das últimas sessões de treino tiveram um declínio acentuado no desempenho, é o momento no qual você consegue visualizar fadiga acumulada o suficiente para garantir uma fase de descanso. É aquele ponto ideal entre o estresse suficiente para que o seu corpo gere adaptação e não muito além do ponto que o corpo vai demorar muito até estar bem recuperado.

Sinal #2: Quando se sentir cansado por 3 dias seguidos

Similar a como medir a queda em seu desempenho para indicar quando você precisa descansar, você também pode usar como se sente no dia-a-dia como um indicador de fadiga geral. Colocando de forma simples, se você se sente progressivamente pior por 3 dias em seguida enquanto treina, é hora de ter algum descanso. E, assim como uma sessão de treino ruim não pode ser um indicador para entrar com o descanso, um dia que está se sentindo cansado demais não vai ser uma indicação de que precisa entrar com um período de recuperação.

Então o quão ruim você tem que se sentir para garantir esse “dia cansado”? Diferentemente de treinos difíceis onde você consegue quantificar de forma consistente e ter com o que comparar, se sentir “mal” por 3 dias seguidos é algo bem subjetivo. Se você está registrando o RPE (o que deveria) de seus treinos, isso pode significar que as suas rodagens de endurance estariam marcando 1 ou 2 pontos acima do normal.

Você também pode observar os comentários de seus treinos (o que também deveria estar registrando) e olhar como descreveu cada sessão de treino. Se os seus comentários indicam que no treino estava se sentindo “lento”, “cansado”, “com o corpo pesado”, ou qualquer vocabulário semelhante, então é um indicador de que você está se sentindo esgotado. De qualquer forma, não tente encontrar métricas rígidas, se você está se sentindo pior (não necessariamente refletindo no desempenho) durante as suas corridas por alguns dias em seguida, é o suficiente para indicar que algum descanso é necessário.

Sinal #3: A fase de treinamento está ficando longa demais

Na falta de medições do declínio do desempenho ou simplesmente o sentimento de esgotamento, você deve ter uma fase de recuperação regularmente. Mas, se o seu treino está progredindo bem e você se sente bem durante as sessões e no dia-a-dia e você continua vendo melhorias a cada semana, existe motivo para entrar com um descanso? A resposta é sim!

É tentador querer estender a fase de treino na falta de fadiga ou queda do desempenho. Mas, mesmo nessas circunstâncias, uma fase de recuperação deve ocorrer de vez em quando. Enquanto não exista uma ciência exata de quando encerrar um bloco de treino, especialmente quando tudo parece estar indo bem, ainda é interessante não deixar o bloco durar mais do que 6 semanas de cada vez, no máximo, antes de aplicar um período de descanso.

Esse período de 6 semanas para um máximo dos ciclos de treino é baseado em um pouco de observação, experiência e alguma ciência. Quando pesquisadores olham o tempo que leva para algum impacto no desempenho acontecer, o período no geral é de 4 a 6 semanas. Ou seja, quando o atleta faz treinos difíceis, demora algo em torno de 4-6 semanas para que este treino se manifeste de alguma forma positiva em seu desempenho e fisiologia. Então, incorporar descanso próximo ao final deste período permite que o atleta aproveite os processos naturais de construção e degradação do seu corpo.

E quanto a monitorar outras métricas fisiológicas?

Recentemente diversas ferramentas que medem variáveis fisiológicas e do estilo de vida se tornaram popular entre atletas tentando ganhar alguma – e qualquer – vantagem em seus desempenhos. Com esses gadgets é possível monitorar a Variabilidade da Frequência Cardíaca, FC de repouso, Ciclos de Sono e provavelmente qualquer outra coisa que puder imaginar. Tecnologias vestíveis, como pulseiras e anéis surgiram com a promessa de avisar quando você está cansado, com o sono comprometido, quando deve andar ou tirar uma soneca, até mesmo se você está comprometido com alguma possível doença.

Enquanto cada um desses dispositivos pode adicionar algum valor no processo de treinamento, é importante manter o contexto em mente e não deixar que o excesso de dados ofusque as informações válidas para monitorar o seu desempenho. A performance, ou a falta dela, vai ser o seu melhor indicador de quando aplicar descanso. A informação vinda dos dispositivos adiciona detalhes a todo o quadro. Eles deveriam fornecer leves orientações para o “sim”, preciso descansar, não conduzir todo o processo.

Fluxograma para decisão do descanso de acordo com os sinais
Fluxograma para decisão do descanso

Não tenha medo de descansar mais cedo

Finalmente, tenha em mente que este fluxograma vai depender de medidas subjetivas e julgamentos (“como se sente?”…). Você não terá uma resposta perfeita e as vezes vai estimar para cima ou baixo por quanto tempo consegue continuar treinando sem um descanso. Se for para errar, é melhor errar para o lado do descanso. O seu corpo só pode lidar com um tanto de estresse por um determinado período de tempo. Então, se você encurtar um pouco a duração da fase de treinamento atual, você dará ao seu corpo a capacidade de estender o próximo bloco de treino.

Enquanto você estiver sendo razoável com os ciclos de treino, se exercite o máximo que puder e descanse quando precisar assim que encontrar algum dos 3 sinais descritos anteriormente.


Fontes:

 

#endorfine-se

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